Perdidos no Natal? Talvez

 

Acordei com os barulhos vindos da cozinha. Hoje o dia começou bem mais cedo e agitado aqui em casa. Motivo? Véspera de Natal.
Tentei voltar a dormir mais a gritaria e correria lá em baixo não deixavam. Levantei-me da cama e fui em direção ao banheiro, escovei meus dentes, tomei um belo banho e desci as escadas em busca de uma xícara de café. Ao chegar, encontrei uma multidão de gente na sala, pelo que parece a família já está toda reunida para fazer a ceia de Natal.
Barulho, barulho e mais barulho. A casa estava insuportável, nesses casos apenas um lugar me traz tranquilidade nesse momento: a casa do meu vizinho, que felizmente é meu melhor amigo.
Subi as escadas novamente em direção ao meu quarto, procurei por meu arquinho com orelhas de gatinho pra tentar amenizar a bagunça a qual meu cabelo se encontrava, e saí pelos fundos de ponta de pé para que ninguém percebesse a minha fuga.
Finalmente fora de casa pude suspirar aliviada, coloquei meu skate no chão e fui rumo a casa de Miguel. No caminho fui admirando a paisagem da minha rua, já que em quase todas as vésperas de Natal o dia fica nublado e quase sempre acaba chovendo, mas não dessa vez. O dia estava ensolarado e dava pra ouvir os passarinhos cantando, a praça estava calma e também sua grama estava verdinha, ainda bem, já que a nossa vizinhança tinha decidido de organizar a festa lá. Diferentemente da casa da Sr. Clark, lá tinha um ar sombrio, as paredes eram pretas e continham algumas rachaduras, o que me faziam estremecer de medo. Também tinham algumas plantas, que por sinal já estavam mortas, pra ornar bem com toda decoração da casa. E hoje pra minha surpresa, hoje a Sr. Clark estava tentando salvar algumas de suas plantinhas, ela molhava as flores com um pequeno regador preto. Perdida nos meus devaneios nem me dei conta que já não estava mais em movimento no meu skate, apenas parada em frente aquela casa sombria e assustadora.

— Ei garota, perdeu alguma coisa?— perguntou com uma cara nada agradável, o que me fez pressionar o skate sobre meu peito e estremecer por inteira.
— Não senhora. — engoli seco — Desculpe a intromissão.
— Esses jovens de hoje em dia... — continuou falando e fechou a porta na minha cara.
— Obrigada Senhor, por esse livramento. — finalmente pude respirar aliviada.

Depois de quase ter um ataque cardíaco, me concentrei em apenas uma coisa: ir pra casa de Miguel. Subi novamente no skate e depois de alguns minutos, finalmente cheguei.
O lado de fora da casa estava muito bonita decorações em branco e vermelho, me faziam sentir a doce e incrível data natalina.
Me aproximei e toquei a campainha, não demorou muito para que Marina, a mãe de Miguel atendesse a porta.

— Samantha! — disse ela me abraçando. — É tão bom te ver por aqui. Vem vamos entrar! — Marina consegue sem esforço algum ser o ser humano mais adorável do mundo. As vezes tenho a impressão que ela gosta mais de mim, do que o Miguel. O que me deixa muito feliz, já que pra mim é mais importante a mãe da pessoa gostar de mim, do que a própria pessoa.
— Tia Marina — respondi devolvendo o abraço. — É tão bom revê-la novamente.
— Falando assim, até parece que passamos dias sem nos ver. — Marina estava certa, eu morava mais na casa dela, do que na minha. Eu venho na sua casa pelo menos umas três vezes na semana, gosto da sua companhia e do carinho que tem por mim.
—Você veio se refugiar no quarto do Miguel, não é mesmo dona Samantha?
— Sim senhora, lá em casa o negócio está sério. — lembrei-me da confusão que havia deixado para trás.
— Entendo — respondeu sorrindo. — ele está no quarto junto com as meninas, pode subir — falou docemente.

— Obrigada, tia Ma! — dei um beijo em sua testa e subi em direção ao quarto de Miguel.

A porta estava entreaberta, o que me possibilitou de ver os cabelos enrolados de Aurora, que estava sentada na cama lendo um livro.

— Olá — falei empurrando a porta.
— Oi, Samy — Miguel respondeu sorrindo.
— Fugindo da correria que tá hoje? — perguntou Aurora sem tirar os olhos do livro que lia.
— Exatamente. Imagino que vocês também.
— É amiga, compartilho da mesma dor que você. Lá em casa está uma loucura. Não aguento mais ver minha mãe e minha vó discutindo pra saber quem faz o melhor bacalhau — bufou Carol, e eu apenas sorri lembrando das competições que a mãe e avó de Carol faziam.
— Como foi passar pela casa da Sr. Clark sozinha pela primeira vez? — perguntou Miguel finalmente tirando os olhos do computador e se virando pra mim.
— Assustador — me joguei na cama lembrando daquela casa assustadora e nada convencional.
— Vocês nunca tiveram curiosidade de saber mais sobre a vida da Sr. Clark? — Carol perguntou se levantando da cadeira e indo até a janela de Miguel que dava diretamente para casa da Sr. Clark.
— Honestamente... Sim — respondeu Aurora fechando seu livro.
— Que tal uma investigação? — sugeriu Miguel.
— Não, não, não. — levantei da cama e comecei a andar nervosamente pelo quarto.
— Qual é Samantha, vai dizer que nunca teve curiosidade de saber mais sobre a vida da temida Sr. Clark. — disse Carol erguendo a sobrancelha e cruzando os braços.
— Nunca quis saber o porquê daquela mulher ser tão amargurada e sozinha? — Aurora franziu a sobrancelha. — além do mais, ninguém nunca foi visto com ela. Tudo bem dela não gostar de ninguém da vizinhança, mas nunca ser vista com alguém, tipo um familiar? Isso é extremamente estranho.
— Vocês estão certas. — Miguel disse por fim. — E se a gente entrasse discretamente na casa da Sr. Clark?
— É uma boa ideia — concordou Carol — Até porque, nunca mais tivemos nenhuma aventura no nosso quarteto fantástico.
— Ok, já que vamos investigar a vida dessa senhora, precisamos urgentemente de um plano — sugeriu Aurora.
— Simples. — começou Miguel. — A porta dos fundos dá de frente com a porta da casa da Sr. Clark. A essa hora, ela está fora de casa. Todos os dias a essa hora ela sai, sabe se lá Deus pra onde. Se a gente for lá agora, dá pra coletar algumas provas e voltar antes mesmo do jantar.
— Eu topo. — Carol foi a primeira a se pronunciar.
— Ok, eu também vou — Aurora concordou.
— Vocês estão loucos, isso é muito perigoso. — A mais medrosa do grupo contestou, ou melhor, medrosa não, apenas cautelosa.
— Vamos lá, Samy. Vai ser divertido. — Miguel disse encorajando a amiga.
— Ok, ok. Mas depois não digam que eu não avisei.
— O que pode dar errado? — Aurora revisou os olhos e fez uma careta.
— Apenas a Sr. Clark fazer picadinho de nós todos.
— Isso não vai acontecer Sam — disse Carol dando tapinhas no meu ombro — Então, vamos lá.

E lá se foram os quatro amigos em direção a casa da Sr. Clark. A entrada foi fácil, já que a porta estava entreaberta.
A decoração de dentro da casa era tão sem graça quanto a do lado de fora, tudo era extremamente sem vida e sem cor. A casa era enorme e obtinha várias obras de artes nas paredes. A cada passo que dava me surpreendia mais e mais com a imensidão daquela casa, até que vi um sala enorme, uma sala que fez meus olhos brilharem, era uma biblioteca cheia de todos os tipos de livros.
— Não toquem em nada. — antes que pudesse terminar minha fala, lá estava ela, a mais curiosa do grupo, com um livro em suas mãos.
— Gente, olhem só esses livros. — disse Carol nos mostrando um pequeno livro.
— Todos eles possuem cadeados — observou Aurora.
— Menos esse aqui — Miguel falou apontando para um livro que estava em cima da mesa.
— O que está esperando? Vamos abra logo.
— Não Carol. É melhor não tocar em nada.
— Qual é Samantha, é só um livro — Carol pegou o livro e o abriu. Não sei como explicar, mas no momento que aquele livro foi aberto, houve um grande clarão em toda a sala. E sem que pudéssemos nos afastar, ou jogar o livro no chão, fomos sugados para dentro dele.
Abri meus olhos e vi meus amigos deitados próximos a mim.

— O que aconteceu? — perguntou Carol se levantando do chão, e olhando a sua volta — que lugar é esse?
— Entramos dentro do livro — respondi também olhando o novo mundo que estava a minha volta.
— O quê? — Aurora gritou — Isso é impossível.
— Rápido, aonde está o livro? — Carol procurava desesperadamente o livro a sua volta.
— Está aqui. — respondeu Miguel, já com o livro em mãos.
— Como viemos parar aqui? Como vamos voltar pra casa? — uma lágrima solitária descia dos olhos de Samantha.
— Calma Samy, vamos dá um jeito — Aurora tentou consolar a amiga.
— Espera. Miguel, qual o nome do livro? — Carol perguntou ao amigo que ainda estava paralisado tentando entender toda aquela situação a qual se encontravam.


Escrito: por Josi Souza (@josi_souza48)