Resgarte

 

– Para! Não vai regar?
– O que? - pergunta parando no portal da porta.
– A planta! - responde apontando para a aningapara como se fosse o óbvio.
– Por que? Choveu ontem, e não está fazendo Sol.
– E daí?
– Daí que não precisa. Ela já tá bem cuidada.
– É algo que precisa ser cuidada todos os dias. Não só quando faz Sol.
– Eu realmente não tenho tempo pra isso.
– Não tem tempo ou não quer?
– Que diferença faz eu não regar um dia? Vai estar viva amanhã, eu garanto.
– Estará, eu sei. Mas e depois?
– Depois o que?
– Primeiro amanhã. Depois de amanhã. E depois e depois.
– Você tá delirando.
– Se não quer regar tudo bem.
– Pelo o amor de Deus! - diz batendo a porta, entrando na casa novamente e indo para a pia, enchendo um copo de água. - Pronto! - fala ao derramar a água sobre a planta, molhando suas folhas e o chão do cômodo.
– Assim não adianta!
– Queria que eu molhasse, tá aí!
– Não queria que molhasse, queria que regasse. Não entende a diferença?
– Você tá fazendo tempestade num copo d'água por conta de uma planta.
– Deixa de ser cabeça dura. Ela precisa de cuidados, todos os dias, não só quando você quer admirar ou que tenha alguma utilidade pra você!
– Que utilidade? É uma planta que mal a vejo. Tenho minhas obrigações. Não posso ficar perdendo tempo assim.
– Se pra você é perda de tempo, por que ainda a tem?
– Você gosta dela, não é? É só você regar.
– O que adianta só eu?
– Continuará viva, independente de quem vai cuidar dela. - responde com fúria, chutando o vaso da planta, causando um estalo forte, afastando quem está perto de susto. - Se isso te incomoda tanto, leva-a daqui. Mas com você cuidando, irá morrer em poucos dias.

De repente, um som é ouvido: uma parte do jarro quebrou. Pequeno, mas a parte cai no chão. Os dois ficam em silêncio, até que o que chutou percebe o que fez e recupera o fôlego, ajeitando seus cabelos.

– Olhe o que você me fez fazer. - diz serenamente.
– Me desculpe.
– Teremos que comprar um jarro novo por sua causa.
– Eu sinto muito. Não queria que levasse a isso.
– Tudo bem, eu te perdoo. Mas, você tem que parar de falar essas besteiras.
– … Você tem razão.
– Agora eu posso ir?
– Claro, desculpe por te atrasar. - não foi necessário a resposta, pois ouviu a porta fechar antes mesmo de responder.

Olhou para a planta e apanhou o copo que estava no chão. Não foi necessário encher com água novamente, o copo se preencheu gradativamente, conforme a admirava sua planta, vendo que já não está como antes.
As folhas estavam amareladas e secas. Algumas caíram no jarro e já estavam em decomposição. Mas, toda vez que isso acontecia, era coberto por adubo, mas já estava em um nível que isso não adiantara mais, pois já estavam mais que visíveis.
Não recebia luz do Sol a dias. Sustentava-se do pouco que recebia.
O copo estava cheio.
Mas não adianta, a planta já está morta.