Parte III - Entregue

 

Eles ficam em uma pista, no alto de um dos prédios dessa cidade secreta. A pista dava acesso a um túnel escuro, aproximadamente dois quilômetros de onde estão parados. A pista é bem enfeitada como toda a cidade, com luzes pelas suas beiradas e um bom espaço livre entre eles e o túnel.

- Tudo pronto, vamos? - pergunta Noah, segurando e sacudindo as rédeas das renas, mas elas não se mexem. - Vamos!
- Vai ver elas estão cansadas. - diz Sandro, com uma pitada de sarcasmo.
- UP! UP!
- Cavalos da guarda real obedecem por comandos. Vai ver que devem ter algum específico.
- Sim. - responde o duende atrás deles, se sentando entre eles, ficando na altura do peito. - Noel diz duas palavras, uma para andarem e outra para voarem.
- E quais são? - pergunta Noah.
- Uma delas é: PRAETERVEHOR.
- … Eu nem vou me atrever a falar isso.
- Praetervehor! - diz Sandro, com autoridade ao tentar repetir a palavra que o feliz lhe conta.

De repente, as renas a sua frente ficam atentas e começam a correr, sem uma prévia, fazendo os meninos serem jogados para trás e os dois duendes se segurarem em seus cabelos para continuarem no trenó.
A velocidade que ganham em pouco tempo é surpreendente, fazendo Noah segurar firme nas rédeas e em segundos já estavam passando pelo túnel, que por incrível que pareça, dava acesso a uma avenida.

- O QUE TÁ ACONTECENDO!? - grita Sandro, confuso por está rodeado de carros, buzinando confusos com aquela cena anormal.
- COMO ELAS VOAM!? - indaga Noah, procurando o Feliz, guiando os animais para não bater em nada.
- Precisa do comando! - diz o duende, levemente assustado.
- Sério!? Qual!? - pergunta Sandro.
- Volare.
- Noah!
- Okay, okay. Volante!
- Que volante o que!?
- Desculpa, eu não tô ouvindo direito com ESSES CARROS QUASE BATENDO NAS RENAS!

Antes que Sandro diga alguma coisa, ouve uma buzina grave, e quando olha para frente, tem a visão de um enorme caminhão indo de encontro a poucos metros deles. Noah puxa com força para desviar, que por pouco não colidem.

- Valorante! Violão! Meu Deus como é a palavra!?
- Volare! - grita o duende, se abraçando com seu companheiro.
- Volare! - repete Noah, desesperado.

As renas na frente deles começam a galopar como se subisse uma escada invisível e indo em direção aos céus, entre as nuvens. Ali, no alto, longe da confusão, buscam fôlego para se acharem na situação.

- … O que foi isso!? - pergunta Sandro, perplexo, com a cara em completo choque.

O duende que acompanha feliz se levanta do susto, sorrindo e fazendo sinais em libras para eles, excitado.

- O que ele tá dizendo?
- Disse que nunca teve uma experiência tão traumatizante como essa. E que espera que no próximo natal estejam conosco de novo. - diz Feliz, traduzindo as libras para eles.
- Eu espero que não. - diz Sandro, antes de ser repreendido por seu amigo com um soquinho no braço.
- Então vamos para a primeira casa. - diz Noah. - Eu consigo visualizar a casa, mas… Como chego nela?
- Siga seus instintos. Noel sempre fazia isso, nunca disse exatamente como fazia… Ele só ia.

Sandro olha para baixo, aquela cidade enfeitada e cheia de cores. O frio em seu rosto não era nada comparado a energia que passa pelo seu corpo, tomada por uma animação que nunca sentira, que o aquece e conforta. Tenta pensar em uma maneira de achar a casa, como um ponto de referência ou algo do tipo.

- Falando nesse Noel, como funciona isso? - pergunta Sandro.
- Não entendi sua pergunta.
- O natal. Tipo, é como nos contos? Crianças boazinhas e tudo mais?
- Sim. Ao longo do ano recebemos registros diários dos acontecimentos mundiais. De cada pessoa. - fala Feliz com certo cansaço em seu tom, como se apenas lembrar do trabalho, lhe cansasse. - Dois dias antes do Natal somos separados para cada setor, que cuidará de uma linha meridiana específica.
- Então o Papai Noel não entrega no planeta inteiro em uma noite? - pergunta Noah, decepcionado.
- Não… Isso seria… Bom… Como se diz…?
- Impossível! - completa Sandro.
- Isso. Não usamos muito essa palavra.
- O San usa sempre.
- Engraçadinho. Achou a casa?
- Não… Eu não conheço a cidade assim para achar uma específica assim.
- Tenta usar esse seu instinto. Se concentra na casa e deixa teu… - Sandro dá um forte suspiro, sem acreditar que vai dizer coisas que sempre julgou como baboseiras. - … Teu coração te guiar.
- Acha que funciona?
- Estamos voando em um trenó. Minha linha que separa o real do irreal tá muito fina.
- Okay, okay… É, como faço isso?
- Olha, eu já trabalhei como motoboy. - diz ao sentar perto dele, olhando as renas correndo no ar. - Tinha momentos que tava em certos lugares e tinha que ir para outros completamente diferentes. Então, eu não pensava em uma rota certeira, sabe? Eu só ia… Minha mente sabia onde tenho que chegar… Meu corpo só tinha que deixar fluir.
- Mas, eu nunca vi essa casa pessoalmente. Muito menos andei na cidade toda.
- Pensa no lugar. Ao redor dele. Onde está agora. A magia do natal tá em você. - Sandro não consegue esconder o refluxo que tem ao dizer isso.

Noah fecha seus olhos e se concentra na casa que veio em sua mente. Inspira e suspira devagar, diferente de Sandro, abraça o vento frio em seu rosto. Sente todas as sensações que aquele voo lhe proporciona. Aperta com mais força as mãos nas rédeas, os pés na madeira, as leves gotas de água em sua pele.
Quando abre os olhos, vê uma linha, como um rastro de poeira dourada, pairando na frente das renas e levando a algum lugar.

- E aí?
- Eu… Eu acho que sei onde fica.
- Boa.

Fazendo um movimento para acelerar os galopes, eles vão em direção a casa. Sandro se segura quando o amigo faz uma curva no ar, indo para um bairro mais a frente, mergulhando.

- É logo ali na frente. - explica ele.
- E o que fazemos?

Dunga olha confuso para Feliz e faz uns sinais rápidos, mas o duende não traduz, apenas responde: “É, também tô achando estranho.”
Em um movimento rápido, sem saber como diminuir velocidade, Noah bate as renas em uma árvore, derrubando todos na grama logo abaixo das folhas, deixando o trenó preso na copa.

- Que aterrissagem! - zomba Sandro, se levantando, com Dunga em sua cabeça.
- Eu não tirei categoria T na carteira.

Sandro olha confuso para ele, sem entender ao certo o que ele quis dizer.

- T de Trenó…

Dunga tampa a boca com as duas mãos para segurar o riso e Feliz se levanta em seguida, perguntando:

- A casa é essa?
- É, é sim. - responde Noah.
- Então vão até o quarto da criança, deixem o presente e voltem. Eu e Dunga cuidamos disso. - ao dizer isso, o duende na cabeça de Sandro pula e vai para perto de seu companheiro.

Com um estalo de dedos de Feliz, o saco de veludo cai na frente deles e ele continua:

- Sabem como funciona, não é?
- … Claro!
- Ainda bem. Podem ir.

Os meninos ficam parados, olhando para o duende, que fica confuso.

- Algum problema?
- É… Pode revisar pra gente? - pergunta Noah. - Sabe como é, né? Primeiro natal como ajudantes.
- O saco mágico só funciona com quem acredita. Ele não vai dar exatamente o que a criança quer, e sim, o que ela precisa. Apenas ponham a mão dentro, leiam a mente da criança e deixem o presente. Bem simples, não?
- Mais que isso, impossível. - responde Sandro apanhando o saco de presentes e puxando Noah.

Quando se afastam dos duendes, Noah pergunta:

- O que foi?
- Não deixa tão na cara que não sabemos dessas coisas. Podem acabar descobrindo.
- Certo. Agora, como vamos entrar?

Eles param de frente a casa. Todas as luzes de dentro parecem estar apagadas. E como é uma casa de dois andares, deduzem que o quarto esteja no alto.

- Chaminé? - pergunta Noah.
- Moramos no Brasil, amigo. Vamos fazer isso do jeitinho brasileiro.
- Como?

Sandro não responde, apenas dá um sorriso de lado e olha para seu companheiro com malícia.

- Olha, eu não tô muito certo que isso é a maneira correta de se fazer isso! - diz Noah.
- Se continuar fazendo barulho, vai acabar acordando eles! Sobe mais um pouco.
- Você não é tão leve, sabia? - diz ao pôr mais força em seus braços e fazer seu amigo subir a janela. Sandro está com os pés nos ombros de Noah quando consegue alcançar a janela e entra na casa.
- Consegui!
- E eu?
- Vou abrir a porta dos fundos! Me espera lá.
- Okay.

Sandro se ergue e nota que a janela levava a cozinha. Por conta de está muito escuro, acaba esbarrando nos móveis perto antes que chegue na porta que ele acredita ser a que leva ao quintal.
Ao abrir, Noah entra devagar e ele cochicha dizendo que a criança está no quarto de cima. Sobem a escada em silêncio e chegam no corredor com três portas. Vão até a segunda e abrem com cuidado para não fazer nenhum barulho.
No quarto, há uma criança dormindo tranquilamente em uma cama perto da janela. Sandro, que está segurando o saco de presentes, põe a mão dentro e se assusta.

- Tá vazio!
- O que? Como assim?
- Tá vazio, ué. - fala ao mostrar a abertura, indicando que não há nada dentro do saco.
- Impossível! Que droga, será que caiu na queda?
- Ou talvez seja com você.
- O que?
- O lance de acreditar. Anda logo, pega! - diz ao dar o saco para o amigo.

Noah, com certa dificuldade, já que parece que o saco ganhara 40kg de uma hora para outra, vai até o garoto. Em sua visão, ele está envolto do mesmo rastro que os trouxe até aquele quarto.
Põe a mão no saco de presentes, que brilha da mesma cor do que o rastro, e de dentro sai uma caixa enfeitada com papel presente e um laço. Ele olha para seu amigo e sorri, extremamente animado por está fazendo aquilo.
Bota o presente perto do pé da cama e fica de pé, sem conter o sorriso de aprovação que tem de si mesmo. Sandro retribui o sorriso e aponta discretamente para a janela, mostrando o trenó flutuando à espera deles.

Na casa de Mirian…
A garota sentada na cadeira ao lado do Noel vê a notícia na televisão, de um trenó que invadiu a Avenida Beira Mar. Ela aperta os dedos e olha para o velho, ainda desacordado, que agora está na cama.
“Espero que façam seu trabalho direito” diz pra si mesma.

Nos altos da cidade…

- Próxima criança? - pergunta Sandro.
- Não parece muito longe.
- Acha que até o fim da noite damos conta? - pergunta Sandro, ao bocejar.
- Vamos sim. Tá com sono?
- Não, só estou cansado da viagem.
- Deve ser chato passar horas em um avião e… Entrar em outro. É ali em baixo. - diz ao mergulhar o trenó novamente.

As próximas horas serviram de treinamento para os garotos. Tendo que forçarem a criatividade para entrarem em cada casa uma delas sem sermos vistos. Indo de entradas pela porta dos fundos, a escaladas e fuga dos cães de guarda.

- Como entramos aqui? - pergunta Noah, vendo que a casa é em condominio.
- Qual a casa?
- Aquela. - diz ao apontar. - Terceira da ponta.
- Me dá o presente.
- O que vai fazer? - pergunta, desconfiado, pondo o presente na mão do amigo.

Sandro mira, e de uma vez arremessa o presente, acertando e quebrando a janela do condomínio. As luzes dos quartos acendem, junto com uma queixa de algo pesado batendo na cabeça de um garoto. “Corre, corre!!” diz Sandro, puxando Noah para o trenó.
Depois de mais meia hora, Sandro não resiste mais ao sono e decide ir comprar um café, buscando um drive thru aberto naquela hora da noite.

- Estamos indo bem. - diz Noah, parando na frente do microfone. - Não sinto mais nenhuma criança na cidade.
- Ainda temos mais cidades!?
- Boa noite. Bem-vindos ao vai e não volta. Qual o seu pedido?
- Um café grande e uma porção de batatas. - responde Sandro, em meio aos bocejos.
- Certo. Só ir adiante que o pedido estará pronto.

Eles vão a alguns metros adiante, onde um atendente novo, com mais ou menos 17 anos fica de boca aberta olhando para aqueles dois estranhos, vestindo como duendes em um trenó.

- É… É… Aqui está… Senhor.
- Obrigado. - diz Sandro, pegando com naturalidade.
- Olha só, você foi bonzinho esse ano. - diz Noah, tirando um presente da sacola e dando para o garoto. - Feliz Natal.

Ele continua sem reação, incrédulo vendo as renas darem meia volta e voando ao céu noturno.

- Sim, respondendo sua pergunta… Parece que não está nessa cidade. - diz confuso, vendo que agora o rastro mudou de cor, que antes era dourado, agora é magenta.
- Noel já deu presentes a muitas crianças antes de mandarem vocês. - diz Feliz. - Então, vamos nessa!

Noah apressa mais uma vez as renas, agora indo para além das fronteiras da cidade. Deixando para trás as luzes das estradas, deixando-os iluminados apenas pelas estrelas. O vento fica mais frio do que antes, fazendo Dunga se aquecer no braço de Sandro.

- Não devemos demorar muito. - diz Noah. - Elas são muito rápidas!
- Eu notei, mas o trenó bem que podia ser coberto. Fica congelando aqui.

Noah ri do amigo e de repente, ouve um som estrondoso, quase ensurdecedor. Olha ao redor e não vê nada.

- O que foi? - pergunta Sandro, alerta.
- Nada, só achei que ouvi algo… É, falando nisso. O que o Papai Noel fazia sem as renas? - pergunta ele ao Feliz.
- Ele gosta de se aventurar sozinho às vezes. O que nos dá uma grande dor de cabeça, já que quase todos os anos, muitos humanos acabam vendo ele e levando a gente a ir atrás deles e apagarem as memórias.
- Os humanos não podem saber que ele existe? - pergunta Sandro.
- Seria uma confusão. Imagina só, um simples humano, de uma hora pra outra descobrindo tudo isso. Iria enlouquecer… Ou pior, ia nos caçar, como antes.
- Caçaram vocês!?
- Sim, a meio milênio atrás… Os humanos têm medo de tudo que é diferente. Acharam que éramos um perigo para a existência deles. Então, o Mestre nos escondeu e nos manteve seguros. Florestas densas se tornaram nosso lar… Vivemos seguros até então. Mas, a linhagem Noel acreditava que os humanos eram bons. Então, a cada geração, era escolhido um campeão para representar essa figura e distribuir esses presentes. Uma recompensa pelo comportamento, mas também, um ponto de esperança… Esperança que um dia, possamos nos revelar sem termos medo.

Sandro fica surpreso com o que acaba de ouvir. Pelo visto, era bem mais que um simples feriado, ainda mais para eles.

- Não sabia que Noel era um cargo. - diz ele, depois de absorver essas novas informações.
- É uma família enorme. Tão antigas quanto a humanidade. A maioria nasce com magia, naturalmente, são esses os escolhidos para representarem essa figura. Mas, se recusam a usar quando não é proveniente.
- Como assim?
- Seguem regras. Regras essas que têm que ser cumpridas pelo bem de sua existência. O poder que tem é capaz de coisas inimagináveis. Mas, como falei, não podem interferir em problemas humanos, nem usá-la contra eles.
- E o que fazem com esse poder?
- Refletem nos humanos. Coragem, força, fé, esperança… Tudo isso vem de muitas vezes, deles. Conseguem emanar energias poderosas nos humanos de uma maneira que os fazem conseguir coisas incríveis. Por que acha que o Natal é o feriado mais aconchegante que existe?

Feliz dá uma risada gostosa de ouvir e tira uma foto do bolso de seu casaco minúsculo e mostra a Sandro. Ele pega com a mão direita e contempla um registro em preto e branco de homens fardados sorrindo juntos para um retrato.

- Esses são soldados. 1914 do calendário humano.
- Primeira guerra mundial… - suspira Sandro, surpreso. - Eles pararam a guerra para… Comemorar o natal.
- Noel não se segurou nesse dia… Esse velhote tem suas manias. Foi um dos meus dias prediletos, envolvendo a demonstração de poderes dele.

Sandro olha fixamente para aquela foto. Tudo que ele acreditava sobre essa data, estava se reformulando…
Noah puxa o trenó para cima de uma vez, fazendo eles serem jogados para trás mais uma vez.

- O que foi isso!? - indaga Sandro.
- Problemas!

Quando se senta novamente, vê que logo atrás deles tem dois jatos A-1 bem atrás deles.

- Era só o que faltava.
- O que é isso!? - pergunta Feliz.
- Proteção do nosso país. Pelo visto, chamamos atenção demais quando aparecemos para os humanos. - responde Sandro. - Consegue despistá-los, Noah?
- Posso tentar.

Noah guia as renas por entre as nuvens, mas os jatos seguem com perfeição, sem nem ao menos sair da vista deles. Nesses movimentos, Sandro e os duendes sacodem de um lado ao outro, tentando se segurar para não serem arremessados para fora.
Dunga olha para Feliz assustado e faz sinal para ele.

- O que ele disse? - pergunta Sandro.
- Que precisamos tirar eles de vista antes que chamem mais atenção e perdemos tempo.
- Isso foi um pouco óbvio.

Os dois jatos aparecem de cada lado do trenó. Antes que Noah perceba, eles fazem um movimento cruzado que para não colidir com eles, o garoto gira o trenó de cabeça para baixo rapidamente. Sandro segura firme com uma mão e com a outra, segura os duendes, dando uma boa vista da altura extraordinária que estão do chão.
Mas, a atenção é voltada ao saco de presentes que cai de repente.

- NÃO! - grita Feliz.

Noah volta o trenó ao normal e eles se sentam. Sandro olha para aquele pequeno ponto vermelho caindo, ganhando velocidade.
Se perderem aquilo, nada dará certo daqui para frente. A missão deles, que ainda nem começaram, iria por água abaixo. Sem pensar, olha para as renas e lembra da explicação do amigo antes disso tudo começar.

- Boa sorte, Noah.
- O que!?

Sandro pula do trenó para as renas, indo para a que está na frente, a mais forte e alta delas, a famosa Rudolph. Ela obviamente o estranha e ele a solta das demais, dizendo: “Olha aqui, me ajuda a te ajudar, beleza!?” e pondo as mãos em seus chifres, impulsiona a rena a mergulhar no ar.

- O que seu amigo está fazendo? - indaga Feliz.
- Ele… Tá sendo o San. - responde Noah, sem acreditar no que acabou de ver, mas volta em si logo depois quando um dos jatos fica em sua cola.

A rena resiste às ordens de Sandro, sacudindo sua cabeça com violência, impedindo dele se segurar em seus chifres.

- Macho, num me estressa não! - diz ao pegar com força e olhar para o jato que parece perceber aquela fulga. - BAIXA!

Sandro mira no saco de presentes e ergue o braço para pegá-lo, mas a resistência do ar o atrapalha a manter seu corpo firme naquela posição, até que o animal volta a voar em linha reta bruscamente, fazendo seu corpo se chocar com o corpo dela.

- O que você tá fazendo!?

Rudolph bufa e o faz olhar para cima, onde o segundo jato estava focado nele.

- Precisamos pegar aquele saco antes, vamos.

Em espiral, ele desce mais uma vez, desviando o atrito do ar com o movimento e indo mais e mais perto, mas o jato passa por ele, criando um vácuo e desestabilizando-o, perdendo o foco e cair do animal, batendo na asa do jato e cair em queda livre.

- PRA QUE EU INVENTEI DE VIAJAR NO NATAL!?

Sem perder o foco, continua fixando o olhar no objetivo e juntando seus braços como se fosse afundar na água, ganha velocidade na queda, ainda longe, mas com esperança de chegar a tempo.

Noah continua tentando sair de vista do jato, mas todos os movimentos que faz são em vão. Até que pensa em alguma coisa que poderia ajudar.

- Se segurem! - diz ao erguer mais ainda o trenó, ficando cada vez mais inclinado, até que fica em linha reta, subindo cada vez mais rápido.

O ar fica pesado, a temperatura mais e mais fria, seus olhos pesam e quase perde as forças para segurar as rédeas. Mas, permanece firme.
As renas perdem força até que como se chegasse em um limite, elas param de galopar, pairam no ar por alguns milésimos de segundos e caem.

Sandro ainda longe do saco de presentes, sente algo sobre seus pés, era a rena que o alcança e o põe novamente em cima de seu pescoço. Com um impulso, pegam os sacos de presentes e antes que se choquem no chão, o animal para no ar e ergue voo, diferente do jato que não consegue fazer o movimento a tempo e vai direto ao chão, fazendo o piloto ejetar antes da explosão do jato ao cair. O choque da explosão faz eles serem impulsionados para frente, caindo no chão, que já estava a poucos metros deles.
Sandro se levanta, vendo que estão no meio do nada, com a única paisagem sendo terra e algumas plantas da mata branca, iluminadas pelo fogo da explosão. Com esforço, fica de pé e pega o saco de presentes e vê, que mais a frente a rena está deitada, também ferida pela queda.

- Desculpa, amigão!

A rena olha para ele e se esforça para ficar de pé, mas sua pata estava coberta de sangue.

- Droga. Vem cá… - diz ao largar o saco de presentes e rasgando um pouco da manga de sua camisa, por baixo da fantasia que Noah lhe deu. Com o pedaço de pano, limpa e amarra, improvisando um curativo para que o sangramento diminua. - Vai ficar bem…

Ele nota que o animal o encara, como se soubesse o que está acontecendo.

- O que? Eu não sou veterinário, mas dá pro gasto, né? - brinca ao pegar o saco de presentes.

Ofegante, Sandro se posiciona corretamente sobre Rudolph e voltam para o trenó, onde ele vê que está em queda livre.

- N-Noah!? Vamos, pocotó!

O trenó continua caindo desgovernado, com Noah quase inconsciente, sem forças para se segurar. Feliz e Dunga se abraçam, vendo seu fim. As renas, sem orientações, ficam sem saber o que fazer, fracas tanto quanto Noah. Ele vê que o jato também está caindo, possivelmente o piloto também ficou desorientado como eles.

- Deu certo! - diz ele, quase sem fôlego.

Pega as rédeas novamente, puxando todo o ar possível, grita: “VOLARE!”. As renas ouvem o comando, se ordenam em suas fileiras e voltam a galopar no ar, com as orientações dele. Cai no banco de uma vez e põe o trenó na rota novamente, e logo acima dele vê algo cortando o céu: Sandro em cima da rena, indo voar ao lado do trenó.

- VOCÊ VIU O QUE EU FIZ!? - grita Noah, animado.
- Se fizer mais uma vez, juro que não vai sobreviver para comemorar!
- Foi demais, admite!
- Você mandou bem.
- Espera aí… - diz Feliz, confuso.

Nesse momento, os meninos percebem que nesses movimentos, suas fantasias acabaram saindo, incluindo as orelhas falsas. Deixando o duende incrédulo ao ver que…

- … Vocês são… Humanos!?